Livre de fronteiras disciplinares, Edgar Morin pensa de forma
transgressora e complexa. Interliga conhecimentos de distintas áreas,
estabelecendo uma comunicação capaz de dotar de sentido o saber. Propõe a
interligação entre ciência, artes e tradição; entre sujeito, objeto e
conhecimento produzido; entre corpo, mente e sentimentos.
Questionando a separação dos conhecimentos em disciplinas que não se
comunicam entre si, argumenta que na escola tradicional aprendemos a
separar e analisar sem, contudo, aprendermos a relacionar e a
interligar.
Seguimos nessa lógica da “separação” e da “distinção” encarando o ser
humano como sendo corpo, mente e sentimentos, partes disjuntas entre
si, ignorando que esses são três aspectos de um todo indivisível e
complexo.
Em
níveis mais amplos, continuamos a mesma lógica de separação e
disjunção. A discriminação social, a estratificação das pessoas em
camadas sociais ou em níveis sociais, ou ainda em castas. As guerras e a
falta de diálogo intercultural. A incapacidade de compreender as
necessidades e os pontos de vista do outro, de outra cultura, de outra
comunidade.
Segundo Morin, nosso atual modelo de educação, fundado sobre a lógica
da disjunção, é incapaz de perceber as relações existentes entre os
conhecimentos, é incapaz de conceber e contemplar, em seu currículo e
sua didática, o ser humano como um todo indiviso. Desta maneira,
contribui para o distanciamento cada vez mais crescente do ser humano
para com os outros e para com a natureza. Sem falar no desconhecimento
do ser humano em relação a si próprio, a seus desejos internos, suas
necessidades, seus sentimentos, medos e anseios.
Para Morin, todo conhecimento é uma tradução e uma reconstrução. Não
existe um conhecimento absoluto, ao contrário, o conhecimento é sempre
passível de erros e ilusões. A ideia de que todos percebemos a mesma
realidade é uma ilusão. A partir da nossa percepção individual,
traduzimos os estímulos que recebemos do exterior e reconstruímos a
realidade conforme nossos próprios processos internos. Ou seja, o que
achamos que é a realidade, na verdade é uma interpretação particular,
individual e só partilhada através da linguagem.
A
educação tradicional, portanto, adotou um único modelo de realidade que
é postulado nos livros didáticos que são perpetuados geração a geração.
Os professores são formados a partir de uma simplificação de mundo onde
eles acreditam que é possível simplificar a realidade para ser melhor
apreendida ou transmitida a seus alunos.
Este é um grande obstáculo o qual a educação planetária, estruturada
sob um Paradigma da Complexidade e não um paradigma da simplificação,
deve conseguir transpor.
Os conhecimentos que criamos na escola tradicional, simplificados e
simplificantes, passam a ser tratados quase como dogmas e esses dogmas
passam a “controlar” a escola, os currículos, didáticas e sistemas de
avaliação. Controlam o fazer do professor, a estrutura das salas de
aula, os corredores e pátios.
Uma educação simplificadora e dogmática, disciplinar, atrofia a
aptidão de contextualizar os conhecimentos. Valoriza muito mais a
separação que a associação de ideias num todo significativo.
A educação planetária deve caminhar em direção às associações, não só
analisando a realidade, mas estabelecendo relações entre os
conhecimentos construídos. Relacionando não somente conteúdos
disciplinares de diferentes áreas, mas também indivíduo, sociedade e
natureza; corpo, mente e emoções.
A
identidade humana, o que nos torna humanos, o que nos une enquanto
seres humanos? Essa é uma questão que não pode ser ignorada pela
educação planetária.
Somos todos muito parecidos geneticamente. Enquanto indivíduos de uma
mesma espécie, temos as mesmas necessidades. Ao mesmo tempo, somos
diversos, em cultura, em organização de sociedades, raças, línguas.
Somos, ainda, parte de uma natureza indivisível. Dependemos de
interligações com outros seres vivos, com seres não vivos, somos
natureza.
Essas são as três dimensões do ser humano: enquanto individuo, enquanto espécie, enquanto ser social.
O ser humano está ameaçado em todas as suas dimensões. Esse
pensamento simplificador da realidade fez com que, ao perdermos a visão
do todo e suas ligações, produzíssemos conhecimentos capazes de nos
distanciar cada vez mais da vida natural e social.
Produzimos ameaças a nós mesmos. Enquanto espécie, estamos ameaçados
constantemente por perigos de guerra, de desastres nucleares, perigos
causados pelo aquecimento global.
Enquanto
ser social, estamos ameaçados por um totalitarismo do capital, por uma
economia que invade fronteiras e busca uma homogeneização capaz de
aniquilar culturas em prol da criação de consumidores para alimentar o
mercado.
Enquanto individuo, o ser humano se perde de si mesmo, ignora sua
espiritualidade, seus anseios, seus desejos e medos. Ameaça a si mesmo e
cai, cada vez mais no abismo das doenças da modernidade: depressão,
ansiedade, obesidade, dentre outros transtornos severos.
Devemos, portanto, através de uma educação planetária, nos proteger
enquanto espécie, enquanto ser social e enquanto indivíduos. A escola
para uma educação planetária deve contemplar esses aspectos em seus
planos curriculares, na didática e atividades cotidianas, em uma nova
concepção espacial da escola.
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